1 – Se somente o que está escrito tem autoridade para revelar Deus e as verdades necessárias à salvação1, parece que Cristo, sendo DEUS SALVADOR, deveria ter deixado algo escrito de próprio punho.
2 – No mais, se só o que está escrito revela a fé cristã, então, Cristo nada revelou porque nada escreveu.
3 – Por fim, se é próprio do autor assinar sua obra, e sendo Deus autor do Livro Sagrado, deveria Cristo, o DEUS ENCARNADO, ter escrito algo para autenticar sua Doutrina, confirmando tudo o que dele se disse e escreveu.
MAS EM CONTRÁRIO:
POVOS, ESCUTAI! NAÇÕES, PRESTAI-ME ATENÇÃO! É DE MIM QUE EMANARÁ A INSTRUÇÃO E A VERDADEIRA RELIGIÃO QUE SERÁ A LUZ DOS POVOS.” (ISAÍAS 51, 4);
OUÇA À MINHA INSTRUÇÃO; ESCUTE AS PALAVRAS DA MINHA BOCA.” (ISAÍAS 1, 27)
SOLUÇÃO:
Cristo veio ao mundo como a lanterna de Deus2, para que por meio dele, todas as gentes recebessem a luz da salvação pela revelação daquilo que estava oculto.
Sua vinda foi anunciada com antecedência nas antigas Escrituras, para que quando viesse, reconhecêssemos nele o Santo Salvador.
Assim, ele não veio para escrever, mas para dar testemunho visível e audível por meio dos seus lábios, sua imagem, seus sinais e de seus milagres, sobre aquilo o que dele se leu e se ensinou, para que tudo que dele tinha sido dito e escrito nas antigas profecias se cumprisse na realidade visível e no testemunho ocular da carne e do sangue:
“ESCUTAI, Ó MEU POVO, QUE EU VOU FALAR: DEUS, O TEU DEUS, SOU EU. ” (Salmo 49, 7)
Daí, não convinha Cristo caligrafar seus ensinos, ao menos por QUATRO razões:
PRIMEIRA:
Para testemunhar que ensinava de sua própria boca com autoridade de um Deus, não precisando respaldar-se em nada, senão em si mesmo, por ser a SABEDORIA ENCARNADA chamada Verbo de Deus:3
“OS JUDEUS SE ADMIRAVAM E DIZIAM: ESTE HOMEM NÃO FEZ ESTUDOS. DONDE LHE VEM ESTE CONHECIMENTO DAS ESCRITURAS?” (São João 7, 15)
‘ENSINARÁ ELE PRÓPRIO O CONHECIMENTO DE SUA DOUTRINA.’ (Eclesiástico 39, 11)
‘PORQUE DE SUA BOCA PROCEDEM CIÊNCIA E PRUDÊNCIA.’ (Provérbios 2, 6)
‘ABRIREI A BOCA PARA ENSINAR EM PARÁBOLAS. REVELAREI COISAS OCULTAS DESDE A CRIAÇÃO.’ (Salmo 77, 2)
“EU E O PAI SOMOS UM.“ (São João 10. 30)
SEGUNDA:
Para não negar a autoridade que conferiu a sua IGREJA,4 pois se tivesse deixado algo caligrafado de próprio punho, pensaríamos que sua autoridade se restringiria aos escritos rubricados por ele, tornando a Igreja inútil no plano da salvação, Igreja esta que edificou sobre os Santos Apóstolos5, e deu-lhe as Chaves que ligam céus e terra, fazendo dela coluna que sustenta as verdades da fé em todos os lugares, povos e épocas, incluindo a verdade das Escrituras, das quais é única mestra e intérprete infalível:
“SAIBAS COMO DEVES PORTAR-TE NA CASA DE DEUS, QUE É A IGREJA DE DEUS VIVO, COLUNA E SUSTENTÁCULO DA VERDADE.” (I Timóteo 3, 15)
“QUEM VOS OUVE, A MIM OUVE; E QUEM VOS REJEITA, A MIM REJEITA; E QUEM ME REJEITA, REJEITA AQUELE QUE ME ENVIOU.” (São Lucas 10, 16)
Por isso:
A PREGAÇÃO DA IGREJA É VERDADEIRA, E NELA HÁ CAMINHO ÚNICO E IDÊNTICO EM TODO MUNDO. ELA FOI CONCEBIDA A LUZ DE DEUS, PORQUE A SABEDORIA DE DEUS, COM A QUAL SALVA OS HOMENS, FALA COM SEGURANÇA,” (SANTO IRINEU DE LION, anos 125-170, Contra as Heresias. vol. IV, par. 20,1. p. 329)
TERCEIRA:
Para mostrar que sua autoridade não se aprisiona à letra dos profetas e dos escribas, estando ainda na TRADIÇÃO APOSTÓLICA6e no MAGISTÉRIO ECLESIÁSTICO7:
“JESUS FEZ AINDA MUITAS COISAS, QUE SE FOSSEM ESCRITAS UMA POR UMA, PENSO QUE NEM O MUNDO INTEIRO PODERIA CONTER OS LIVROS QUE SE DEVERIAM ESCREVER.” (São João 21. 26)
Embora nada tenha escrito, Cristo tudo fez com autoridade e propósito:
“EM TUDO O QUE FIZESTES CONSERVA A TUA AUTORIDADE.” (Eclesiástico 33, 23)
Essa autoridade oral que os Apóstolos receberam dele, eles transmitiram a Igreja:
“ESPERO IR VER-TE EM BREVE E ENTÃO FALAREMOS DE VIVA VOZ. (III São João 1, 14)
“FICAI FIRMES E CONSERVAI OS ENSINAMENTOS QUE DE NÓS APRENDESTES, SEJA POR PALAVRAS, SEJA POR CARTA NOSSA.” (II Tessalonicenses 2, 15)
A Igreja Católica é a voz das Escrituras, como as Escrituras são a síntese da memória escrita da Igreja.
Portanto, IGREJA e ESCRITURAS são inseparáveis, pois não se pode ter a fé em partes, senão, num todo.8
QUARTA:
Porque sendo eternos os seus ensinamentos, não poderiam ser limitados e estarem restritos no tempo e na época em que foram escritos.
Papel e letra são estáticos, mas as manifestações da autoridade divina são constantes e contínuas no curso da história humana.
Questões surgidas em nossa época, como pesquisas em células-tronco; uso da energia nuclear; eutanásia; doação de órgãos; de sangue e proteção ao meio ambiente, dentre muitas que a Igreja deve dar resposta na fé, obviamente não haviam na época dos escritores sacros.
Por isso, Jesus deixou ao MAGISTÉRIO DA IGREJA, o governo das coisas futuras por meio daqueles que investidos na Cátedra de Pedro, devem orientar nas situações vindouras, as quais Jesus não antecipou aos Apóstolos, pois não compreenderiam, mas que se revelariam a Igreja no tempo oportuno:
“MUITAS COISAS AINDA TENHO A DIZER-NOS, MAS NÃO AS PODEIS SUPORTAR AGORA.” (São João 16. 12)
“EIS QUE ESTOU CONVOSCO TODOS OS DIAS, ATÉ O FIM DOS TEMPOS.” (São Mateus 28,20)
O Magistério da Igreja orienta vivermos as leis divinas em nossa época.
A Encíclica Samaritanus Bonus e o Catecismo em seu n° 2.277, por exemplo, orienta a não odiar a vida a ponto de aderir a eutanásia ou suicídio assistido, o que não havia na época em que as Escrituras estavam sendo elaboradas, no que se responde as questões:
1 – Os judeus possuíam as Antigas Escrituras dos Profetas, mas como tinham caído em apostasia e heresia, a tradição rabínica na qual as interpretavam lhes ofuscava as verdades sagradas, e quando Cristo esteve dentre eles, não puderam reconhecê-lo:
“VÓS EXAMINAIS PROFUNDAMENTE AS ESCRITURAS JULGANDO ENCONTRAR NELAS VIDA ETERNA, MAS SÃO ELAS MESMAS QUE DÃO TESTEMUNHO DE MIM. E VÓS NÃO QUEREIS VIR A MIM PARA QUE TENHAIS VIDA. (São João 5. 39)
“O VERBO ERA A VERDADEIRA LUZ, QUE VINDO AO MUNDO, ILUMINA TODO HOMEM. ESTAVA NO MUNDO E O MUNDO FOI FEITO POR ELE, E O MUNDO NÃO O RECONHECEU. ELE VEIO PARA OS SEUS, MAS OS SEUS NÃO O RECEBERAM.” (São João 1. 10 e 11)
Cristo não precisava dar-lhes novas Escrituras feitas de seu próprio punho, mas substituir a gnóstica e supersticiosa tradição, pela Tradição que tem na Igreja sua guardiã:
“OUVIMOS DIZER QUE JESUS DE NAZARÉ HÁ DE DESTRUIR ESTE LUGAR, E HÁ DE MUDAR AS TRADIÇÕES QUE MOISÉS NOS LEGOU”. (Atos 6, 14)”
Disse-lhes o Cristo:
“POR QUE VIOLAIS OS PRECEITOS DE DEUS POR CAUSA DE VOSSA TRADIÇÃO?’ (São Mateus 15, 3)
“POR ISSO, ATÉ O DIA DE HOJE, QUANDO LEEM MOISÉS, UM VÉU COBRE-LHES O CORAÇÃO.’ (II Coríntios 3, 15)”
Assim, a tradição dos rabinos restou substituída pela Tradição Apostólica, através da qual as Escrituras devem ser cridas e lidas:
‘INTIMO-VOS, IRMÃOS, EM NOME DO NOSSO SENHOR JESUS CRISTO, QUE EVITEIS A CONVIVÊNCIA DE TODO IRMÃO QUE LEVE VIDA OCIOSA E CONTRÁRIA A TRADIÇÃO QUE DE NÓS TENDES RECEBIDO.’ (II Tessalonicenses 3, 6)
2 – Cristo não se divida da Igreja que é seu Corpo Místico, e assim, ele batiza, salva, cura, dá o dom da caridade, ministra os sacramentos e realiza a oferta do seu sacrifício eterno de amor eucarístico, ordena sacerdotes, perdoa pecados, instrui e ensina, dentre outras coisas, através da Igreja:
‘JESUS DISSE: SE RECUSAR OUVIR TAMBÉM A IGREJA, SEJA ELE PARA TI COMO UM PAGÃO E UM PUBLICANO.’ (São Mateus 18. 17 e 18)
Logo, foi por meio da Igreja que Cristo escreveu o Novo Testamento, pelas mãos dos Apóstolos e discípulos, como já tinha escrito o Antigo Testamento através dos reis e profetas de Israel.
3 – A assinatura de Cristo nas Escrituras está carimbado na fé da Igreja.
Muitos livros se dizem a revelação e a palavra de Deus.
Todavia, acreditamos que as Escrituras cristãs expressam a verdade Divina porque fazem parte do tesouro espiritual da Igreja edificada pelo próprio.
EU NÃO CRERIA NO EVANGELHO SE A ISSO NÃO ME LEVASSE A AUTORIDADE DA IGREJA CATÓLICA. (Carta contra Mani. 5, 6)
Num matrimônio sagrado, a Esposa, aqui representada pela Igreja e o Esposo, representação de Cristo, são uma só carne, razão porque:
“EU TE MOSTRAREI A NOIVA, A ESPOSA DO CORDEIRO.’ (Apocalipse 21, 9)
A RESPEITO DO SENHOR E SEU CORPO, SABEMOS QUE ALGUMAS VEZES É DITO “CABEÇA” E “CORPO”, ISTO É, CRISTO E A IGREJA COMO UMA SÓ PESSOA. ELE, SENDO O NOIVO, COLOCOU NELA UM DIADEMA, E ADORNOU-LHE COM ENFEITOS, COMO SUA NOIVA.” (SANTO AGOSTINHO. Doutrina Cristã. Cap. 31 I r. 44 p. 116)
1Lutero, em “Fórmula da Concórdia. Suma III; Artigos de Esmalcaide, art. II, segunda parte, 15, Livro da Concórdia”.
2 “Porque o MANDAMENTO é LÂMPADA; e a LEI É LUZ, (Provérbios 6. 23); EU SOU A LUZ DO MUNDO, disse Cristo. (São João 8. 12); LUZ PARA REVELAÇÃO aos gentios, e para glória de teu povo, Israel. (São Lucas 2. 32); “Porque o Senhor é o nosso JUIZ, e nosso LEGISLADOR. (Isaías 33. 22); “A LUZ VEIO AO MUNDO, mas os homens amaram mais as trevas que a LUZ, porque as obras desses homens eram más. (São João 9. 5)
3 Verbo ou Logos, no grego (λόγος) que significa a PERSONIFICAÇÃO da Palavra, dos Mandamentos, da Sabedoria e da Ciência de Deus.
4 Autoridade esta, reconhecida desde os antigos, nos primeiros séculos do cristianismo: “Com efeito, deve necessariamente estar de acordo com ela (Igreja), por causa de sua origem mais excelente, porque nela sempre foi conservada, de maneira especial, a Tradição que deriva dos Apóstolos. (Contra as Heresias, Santo Irineu de Lion, Livro IV par. 3.2. p. 147, anos 125-180) “Deve-se amar com zelo extremo o que vem da Igreja. Ela é definitivamente o caminho de acesso à vida, e todos os outros são assaltantes e ladrões que é mister evitar.” (Contra as Heresias, Santo Irineu de Lion, Livro IV par. 4.1. p. 147, p. 148)
5 “[…] edificados sobre o FUNDAMENTO DOS APÓSTOLOS E PROFETAS, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus. É nele que todo EDIFÍCIO, harmonicamente disposto, se levanta ATÉ FORMAR UM TEMPLO SANTO no Senhor. É nele que também vós outros entrais conjuntamente, pelo Espírito, na ESTRUTURA DO EDIFÍCIO que se torna a HABITAÇÃO DE DEUS.” (Efésios 20 a 22)
6 Sagrada Escritura é a Palavra de Deus redigida. Sagrada Tradição são os ensinamentos da Palavra de Deus que não estão apenas nos escritos, mas também na Liturgia das Primeiras Missas, nos ensinos das orações e rezas mais antigas da Igreja, no Catecumenato, nos Catecismos do primeiro século do Cristianismo (Didaqué), nos sinais deixados nas paredes das Catacumbas, nossas primeiras Salas de Catequese e Templo, nas Cartas e Mensagens escritas pelas Comunidades desde o tempo dos Apóstolos, nas Decisões Doutrinárias dos Concílios: “Nas cidades pelas quais passavam, ensinavam que OBSERVASSEM AS DECISÕES QUE HAVIAM SIDO TOMADAS PELOS APÓSTOLOS E ANCIÃOS EM JERUSALÉM. Atos dos Apóstolos 16, 4)”, na arqueologia e Patrística que é a Filosofia da Igreja, dentre outros meios de comunicação verbal ou não verbal da Palavra. Quanto à Sagrada Tradição, ela transmite integralmente aos sucessores dos apóstolos até nossos dias, a Palavra de Deus confiada por Cristo e pelo Espírito Santo aos Apóstolos para que, sob a luz do Espírito de verdade, eles, de forma sobrenatural e extraordinária, fielmente a conservem, expusessem e transmitissem. (Catecismo Igreja Católica, T 20 – Tradição § 81)
7 Catecismo §85 “O ofício de interpretar autenticamente a Palavra de Deus escrita ou transmitida foi confiado unicamente ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus Cristo”, isto é, foi confiado aos bispos em comunhão com o sucessor de Pedro, o bispo de Roma. s fiéis, lembrando-se da palavra de Cristo a seus apóstolos: “Quem vos ouve a mim ouve” (Lc 10,16), recebem com docilidade os ensinamentos e as diretrizes que seus Pastores lhes dão sob diferentes formas. Todavia, o Magistério não está acima da Tradição, nem das Escrituras, mas sim, a serviço deles. §890 A missão do Magistério está ligada ao caráter definitivo da Aliança instaurada por Deus em Cristo com seu Povo; deve protegê-lo dos desvios e dos afrouxamentos e garantir-lhe a possibilidade objetiva de professar sem erro a fé autêntica. O ofício pastoral do Magistério está, assim, ordenado ao cuidado para que o Povo de Deus permaneça na verdade que liberta. Para executar este serviço, Cristo dotou os pastores do carisma de infalibilidade em matéria de fé e de costumes. O exercício deste carisma pode assumir várias modalidades. §891 “Goza desta infalibilidade o Pontífice Romano, chefe do colégio dos Bispos, por força de seu cargo quando, na qualidade de pastor e doutor supremo de todos os fiéis e encarregado de confirmar seus irmãos na fé, proclama, por um ato definitivo, um ponto de doutrina que concerne à fé ou aos costumes… A infalibilidade prometida à Igreja reside também no corpo episcopal quando este exerce seu magistério supremo em união com o sucessor de Pedro”, sobretudo em um Concílio Ecumênico. Quando, por seu Magistério supremo, a Igreja propõe alguma coisa “a crer como sendo revelada por Deus” como ensinamento de Cristo, “é preciso aderir na obediência da fé a tais definições. Esta infalibilidade tem a mesma extensão que o próprio depósito da Revelação divina.
8 Porquanto, quem obedece a toda a Lei, mas tropeça em apenas uma das suas ordenanças, torna-se culpado de quebrá-la integralmente. (São Tiago 2. 10)