SE PODEMOS ESCOLHER LIBERDADE OU ESCRAVIDÃO.

1 — Para alguns1, nascemos escravos do pecado, pois a vontade humana se corrompera ao ponto de estarmos absolutamente escravizados as práticas contínuas da maldade e da transgressão a Lei Divina e natural.

2 Em defesa de tal ideia, há o fato de que na história humana existiram mais os que fizeram o mal que os que praticaram o Bem.

3 — Alegam que não há em nós o domínio da razão e dos instintos, os quais buscam agora somente a satisfação dos desejos egocêntricos através de práticas que corroem o Bem comum e particular.

4 — Sustentam por fim que a liberdade não restou conservada após o pecado adâmico.

MAS EM CONTRÁRIO, ensinava o Santo Filósofo da Igreja: “Qualquer espírito racional há de ser mais nobre e poderoso que qualquer instinto. Um corpo pode vencer uma alma dotada de virtudes? Evidente que não. Portanto, não há nenhuma outra realidade que torne a mente cúmplice da paixão, a não ser a própria vontade e o livre arbítrio. ” (AGOSTINHO. O Livre Arbítrio e a Origem do Mal, p. 36 Cap. 11 par. 21c).

SOLUÇÃO: As tentações e seduções2 que nos levam ao desejo de transgredir provam que a vontade não está totalmente dominada e corroída, tendo que ser vencida, convencida e seduzida para só então, conduzir-nos voluntariamente ao pecado. Todo ato mal se realiza no âmbito da liberdade sem freios ou eixos, a qual desgoverna nossa vontade ao ponto de não mais enquadrá-la na vontade de Deus. Todo pecado nasce da desordem da liberdade extrema e ilimitada que nos faz ESCRAVOS VOLUNTÁRIOS DE NÓS MESMOS, nos tornando reféns de nossos maus hábitos, instintos irracionais e imperfeições quando nos oferecemos livremente a todo tipo de maldade: “Não sabeis que QUANDO VOS OFERECEIS A ALGUÉM para lhe obedecer, SOIS ESCRAVOS daquele a quem obedeceis, quer seja do pecado para a morte, quer da obediência para a justiça?” (Romanos 5. 16). Aquele que faz tudo o que deseja não é livre, mas escravo de sua própria vontade e natureza. Logo, não nascemos escravos, mas nos escravizamos, quando agimos sem os freios da regra Divina. A escravidão ao pecado é, portanto, produto da vontade livre que se deixa escravizar, pois só através da liberdade o ser humano se autodetermina a essa escravidão, como só através da liberdade ele se autodetermina ao amor. Ora, se o pecado nasce da liberdade incontida que nos conduz à desordem, é certo então que a liberdade da vontade existe, sendo esta, a única causa da escravidão daqueles que nesta condição se permitem estar, como ensinou o Apóstolo: Quando ÉREIS ESCRAVOS do pecado, ÉREIS LIVRES a respeito da justiça. (Romanos 6, 20)”, no que se responde as questões acima.

1 — O ser humano não nasce escravo do desejo de transgredir, mas com o desejo inevitável de ser feliz,3 e numa busca desenfreada pela felicidade ele acaba errando o alvo, procurando-a em obras, atos ou pensamentos que violam o Amor Divino, de onde nasce a ofensa a Deus e ao próximo. Onde há excesso da liberdade e desejos incontidos, haverá mais escravidão, e mais rígido o grilhão e as algemas que nos tornam reféns de nós mesmos. A liberdade será um Bem perfeito se utilizada para sua finalidade que é amar a Deus e ao próximo, pois ninguém ama por obrigação ou coação. Todavia, a liberdade pode vir a ser um bem corrompido, um mal quando desvirtuada de seus fins: “Toda vontade é indeterminada e incerta, até que a razão coloque à sua disposição as opções para que, após um prévio juízo racional avaliativo se determine, pelo apetite do prazer, alcançar aquilo que se escolheu. (JOVILET. Régis. Teologia e Psicologia. Livro II. Cap. II, P. 534. DA LIBERDADE) 

2 — De fato, pode existir os que mais fazem mal, que os que fazem o Bem, o que prova que muitos estão por vontade própria escravos da maldade, enquanto outros estão livres pela Graça Divina, para as realizações generosas da caridade, do que é certo que nem toda vontade se verte ao desejo da transgressão.

3   Quem rouba, determina sua escolha dentro de um leque de opções informadas pelo intelecto. Se escolheu roubar é certo que pelo juízo racional ele identificou e colocou como fator determinante de sua ação o lucro que sua conduta gananciosa proporcionará. Nisso temos o domínio da vontade, que se volta apenas a satisfação da cobiça, prevalecendo sobre a caridade ao desconsiderar o prejuízo daquele que trabalhou, e, portanto, tem direito legítimo de usufruir do fruto do seu trabalho. Escolhendo não roubar também é certo que em juízo racional, ele mediu a consequência espiritual (restrição beatífica), social ou legal (restrição ética ou moral) que o ato ilícito custará, o que lhe fez deliberadamente desistir de levar à frente a ação criminosa. A história da humanidade revela assim que haverá sempre mais de uma  opção ao nosso redor, cotidianamente. Logo, a escolha entre o Bem e o mal estará sempre presente: “Tomo hoje por testemunhas o céu e a terra contra vós: ponho diante de ti a vida e a morte, a bênção e a maldição. ESCOLHE, pois, a vida, para que vivas com a tua posteridade, (Deuteronômio 30, 19)”

4 – O ser humano, com o pecado adâmico, perdeu os bens eternos, mas não os bens temporais que lhes foram poupados, como a liberdade e o direito à vida natural, os quais, todavia, sofreram certa e relativa corrupção nos seus fins. E assim, se a vida natural restou corrompida com a morte natural, também a liberdade restou corrompida porque agora ela pode contemplar e desejar os frutos da maldade, dando-lhe o mal como opção. Não há fator externo que aprisione o indivíduo a este mal, senão a vontade livre que o faz querer, e o querer o faz buscar, no que ensinou o Primeiro dos Apóstolos: “Comportai-vos como HOMENS LIVRES, e não à maneira dos que tomam a liberdade como véu para encobrir a malícia, mas vivendo como  SERVOS de Deus. (I São Pedro 2, 16)”


1 Lutero (Nascido Escravo. Argumento III, p. 47 De Servo Arbitrio. Resumo de Clifford Pond), e também Calvino (Cap. III, p. 63. As Institutas – Livro II e Livro III cap. III p. 81)

2 Nossa escravidão NÃO É FATALISMO DE NASCENÇA, como erradamente entendeu Lutero, mas consequência da vontade sem as barreiras da santidade e do temor a Deus. O fato dos demônios terem de usar da tentação para induzir nossa vontade, e nos seduzir para que cometamos pecados, prova que não estamos escravos do mal, senão, até que a nossa vontade livre assim o queira. Ora, nenhum senhor precisaria seduzir ao seu escravo para que este lhe obedeça, senão, apenas ordená-lo, o que demonstra que não somos totalmente cativos do pecado, mas  inclináveis ao delito, e, portanto, sugestionável à transgressão: “Compreendes quão precioso bem falta ao rosto quando lhe faltam os olhos. Todavia, se eles existem, quem no-los deu a não ser Deus, o dispensador de todos os bens? Por conseguinte, do mesmo modo como aprovas a presença desses bens no corpo e que, sem considerar os que deles abusam, louvas o doador, de igual modo deve ser quanto à vontade livre, sem a qual ninguém pode viver com retidão. Deves reconhecer que ela é um bem e um dom de Deus, e que é preciso condenar aqueles que abusam desse bem, em vez de dizer que o doador não deveria tê-lo dado a nós. (Santo Agostinho. O Livre Arbítrio e a Origem do Mal p. 89 Cap. 18 par. 48) ”

3 Catecismo §1718 O desejo de felicidade As bem-aventuranças respondem ao desejo natural de felicidade. Este desejo é de origem divina: Deus o colocou no coração do homem, a fim de atraí-lo a si, pois só ele pode satisfazê-lo.

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