ABRAÃO É UMA TIPOLOGIA DE MARIA?

1 – Parece que inexiste semelhança entre Abraão e Maria, pois nenhuma virtude ou característica pode identificar o homem da Antiga Aliança com a mulher da Nova Aliança.

2 – No mais, cada um viveu separado por séculos, razão porque, não haveria intercâmbio entre os acontecimentos que cada um vivenciou em sua respectiva época.

3 – Além disso, Isaque, filho de Abraão, foi poupado e não chegou a ser sacrificado, ao contrário de Jesus, filho de Maria, a quem Deus não poupou da morte na cruz.

4 – Por fim, se pensavam os hebreus, que a mulher era inferior ao homem[1], ter Matriarca ao invés de Patriarca, colocaria a Nova Aliança inferior à Antiga, a qual tinha Abraão como patrono.

MAS EM CONTRÁRIO:

Abraão, assim como Maria, em suas respectivas épocas, foram pais de primogênitos[2], os quais Deus destinou à morte.

Deus provou a fé de Abraão, dizendo-lhe:

“TOMA TEU FILHO, TEU ÚNICO FILHO A QUEM TANTO AMAS; E VAI À TERRA DE MORIÁ, ONDE TU O OFERECERÁS EM SACRIFÍCIO SOBRE UM DOS MONTES QUE EU TE INDICAR. […]  E ESTENDENDO A MÃO, TOMOU A FACA PARA GOLPEAR O SEU FILHO.” (Gênesis 22, 2 e 10)

E também a fé de Maria, ao lhe revelar as dores da crucificação:

“SIMEÃO ABENÇOOU-OS E DISSE A MARIA, SUA MÃE: “EIS QUE ESTE MENINO ESTÁ DESTINADO A SER UMA CAUSA DE QUEDA E DE SOERGUIMENTO PARA MUITOS HOMENS EM ISRAEL, E A SER UM SINAL QUE PROVOCARÁ CONTRADIÇÕES, A FIM DE SEREM RELEVADOS OS PENSAMENTOS DE MUITOS CORAÇÕES. E UMA ESPADA TRANSPARASSÁ A TUA ALMA.” (São Lucas 2, 34 e 35)

Há, portanto, inegável correspondência entre as tipologias Abrâmica e Mariana.

SOLUÇÃO:

Existe imagens implícitas de Jesus nas figuras, personagens, sinais e acontecimentos narrados nas antigas Escrituras.[3]

Tais, muito embora imperfeitas e incompletas, representavam as realidades que viriam Dele, como o nascimento, a filiação, a crucificação, a ressurreição, a Igreja e os Apóstolos, dentre outros.

Como ensinou Orígenes:

“AS COISAS QUE FORAM ESCRITAS, DE FATO, SÃO FORMAS DE CERTOS MISTÉRIOS E IMAGENS DAS COISAS DIVINAS.” (De Principiis, II Parte, cap. IV, anos 185-254)

Os episódios que envolveram Isaque e Abraão, foram representações antecipadas da crucificação[4] que teria em Jesus a figura central:

DISSE JESUS: ABRAÃO, VOSSO PAI, EXULTOU AO VER O MEU DIA. VIU, E FICOU CHEIA DE ALEGRIA. (São João 8, 56)

Por conta disso, tais eventos, também continham representações daqueles que o acompanharam na crucificação, dentre eles, Maria.

Como Isaquec correspondia à Jesus, Abraão, seu genitor, obviamente, reportava à Maria, genitora de Jesus, no que se responde as questões:

1 – Da tentativa do sacrifício de Isaque e da crucificação do Messias, emergem um Pai e uma Mãe padecendo de dores inigualáveis por terem escolhido amar a Deus sobre todas as coisas, ainda que ao custo da vida dos seus primogênitos.

Mas não apenas nisso Abraão e Maria se assemelham.

Há fatos e circunstância comuns entre ambos, dos quais, destacam-se: 

* DA ANUNCIAÇÃO:

Deus anunciou a Abraão por meio de três anjos, o nascimento de Isaque; como à Maria por meio do anjo Gabriel, o nascimento do Redentor:

“O Senhor apareceu a Abraão que levantou os olhos e viu três homens de pé diante dele. Levantou-se no mesmo instante da entrada de sua tenda, veio-lhes ao encontro e prostrou-se por terra. E disseram-lhe: “Onde está Sara, tua mulher?” “Ela está na tenda” – Respondeu Ele: “Voltarei à tua casa dentro de um ano, a esta época; e Sara, tua mulher, terá um filho. (Gênesis 18-1, 2, 9 e 10)

Entrando, o anjo disse-lhe: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo. O anjo disse-lhe: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. (Lucas 1. 28, 29, 30 e 31)

* DA AGRACIAÇÃO:

Tanto Abraão, quanto Maria, por conta de seus filhos anunciados, foram jubilados com bênçãos extraordinárias:

Meu Senhor – disse ele – se encontrei graça diante de vossos olhos, não passeis avante sem vos deterdes na casa de vosso servo.” (Gênesis 18, 3) “respondeu ele. Voltarei à tua casa dentro de um ano,” (Gênesis 18, 10)

“O anjo disse-lhe: “Não temas, Maria, pois encontraste graça diante de Deus.” (Lucas 1, 30)

* DA PATERNIDADE E MATERNIDADE EXTRAORDINÁRIAS:

A idade avançada de Abraão; sua esposa estéril por sua longevidade[5]; e a virgindade de Maria, que concebe sem contato com homem, não impediram o nascimento de seus primogênitos:

Abraão e Sara eram velhos, de idade avançada, e Sara tinha já passado da idade.” (Gênesis 18, 11)

 “Sara concebeu e, apesar de sua velhice, deu à luz um filho a Abraão, no tempo fixado por Deus. Abraão pôs o nome de Isaque ao filho que lhe nascera de Sara.” (Gênesis 21. 2 e 3)

Maria perguntou ao anjo: “Como se fará isso, pois não conheço homem? Respondeu-lhe o anjo: “O Espírito Santo descerá sobre ti, e a força do Altíssimo te envolverá com a sua sombra.” (Lucas 34, 35)

* DA RESIGNAÇÃO COM A MORTE DOS FILHOS.

Resignação é traço de fé.

Nem diante do trágico destino de seus primogênitos, expressaram minimamente revolta, inconformismo ou protesto.

Temos em Abraão e Maria, o sofrimento provindo da obediência, porquanto não se voltaram contra Deus:

“Toma teu filho, teu único filho, a quem tanto amas, ISAQUE; e o oferecerás em sacrifício.” (Gênesis 22.2)”

Jesus viu sua mãe e perto dela o discípulo que amava.” (João 19, 25)

* DA CAMINHADA AO LOCAL DO SACRIFÍCIO.

Abraão peregrinou com seu primogênito ao ponto mais alto do Monte Moriá.

Do mesmo modo fez Maria, que junto à uma procissão, peregrinou com seu primogênito até o cume do Monte Calvário, aonde seria crucificado.[6]

Abraão tomou a lenha do holocausto e a pôs aos ombros de seu filho Isaque, levando ele mesmo nas mãos o fogo e a faca. E, os dois iam cami­nhando juntos,” (Gênesis 19, 30)

Junto à cruz de Jesus estavam de pé sua mãe; a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena.” (João 19, 25)

*DO SACRIFÍCIO NAS MONTANHAS DE ISRAEL:

O destino de Isaquec, primogênito de Abraão, haveria de ser selado no cume do Monte Moriá:

[…] oferecerás em sacrifício sobre um dos montes que eu te indicar.” (Gênesis 22.2)

Enquanto o destino de Jesus, primogênito de Maria, foi selado no alto do Calvário:

Chegados que foram ao lugar chamado Calvário, ali o crucificaram.” (Lucas 23, 33)

* DA DESCENDÊNCIA REAL:

Foi prometido a Abraão, assim como Maria, a realeza em sua descendência:

“Tornarei a ti extremamente fecundo, farei nascer de ti nações e terás reis por descendentes.” (Gênesis 17, 6)

E isso e se cumpriu desde os antigos reis de Israel, até Cristo, o Rei dos reis:

“Nataniel respondeu, e disse-lhe: Rabi, tu és o Filho de Deus, tu és o Rei de Israel.” (João 1. 49)

Assim, todo processo de Revelação Divina, atestado nas Escrituras, é considerado à partir de Cristo.

Entende-se, desta maneira, que o Antigo Testamento nos aponte em direção ao Novo, predizendo dele fatos, sinais e personagens futuras.

2 – O Antigo e Novo Testamentos estão ligados por uma Aliança eterna e única que Deus fez com a humanidade.

Logo, o tempo curto ou longínquo entre eventos ou pessoas é absolutamente irrelevante.

Essa Aliança, que foi constituída por sangue no Antigo Testamento, também o foi no Novo.

Deus escolheu Abraão, e o convidou a fazer com ele uma Aliança:

“FAÇO ALIANÇA CONTIGO E COM TUA POSTERIDADE, UMA ALIANÇA ETERNA, DE GERAÇÃO EM GERAÇÃO, PARA QUE EU SEJA O TEU DEUS E O DEUS DE TUA POSTARIDADE.” (Gênesis 17,10,)

Daí, formou-se o povo hebreu, da posteridade de Abraão, da qual futuramente viria o Messias.[7]

Pactuou-se com ele a primeira fase da Aliança, firmada no sangue derramado na circuncisão do seu primogênito:

ABRAÃO CIRCUNCIDOU SEU FILHO ISAQUE, ASSIM QUE ELE COMPLETOU OITO DIAS DE VIDA, EXATAMENTE COMO DEUS LHE ORDENARA.” (Gênesis 21,4)

“CORTAIS A CARNE DO VOSSO PREPÚCO, E ISSO SERÁ SINAL DA ALIANÇA ENTRE MIM E VÓS.” (Gênesis 22, 11)

E Deus escolheu Maria, aquela que deu a Cristo a descendência em Abraão pela carne[8], e a convidou a renovar a Aliança, no que ela aceitou quando disse o seu sim:

“DISSE MARIA: “EIS AQUI A SERVA DO SENHOR. FAÇA-SE EM MIM, SEGUNDO A TUA PALAVRA.”  (São Lucas 1, 38)

Então, Deus a preparou para conceber e dar a luz, aquele que fora predito, desde Abraão, como Verbo Divino encarnado, o salvador da humanidade.

E, tal como a Antiga Aliança, a Nova também fora firmada no sangue derramado na cruz, pelo primogênito de Maria:

“ESTE CÁLICE É A NOVA ALIANÇA EM MEU SANGUE, QUE É DERRAMADO POR VÓS.” (Lucas 22,20)

“UM DOS SOLDADOS ABRIU-LHE O LADO COM UMA LANÇA, E, IMEDIATAMENTE, SAIU SANGUE E ÁGUA.” (São João 19, 34)

O sangue vertido na circuncisão que Isaque se submetera, fora um sinal, uma prefiguração do sangue que no futuro seria vertido por Cristo, na cruz.

Conclui-se, portanto, que a Aliança sendo eterna, não pode ser cindida no tempo.

3 – A dor de ter que entregar um filho para morrer em sacrifício por vontade Divina é igual em Maria e Abraão, tanto quanto, a alegria de receber a notícia de que Deus não pretendia a morte de Isaque, tanto quanto, a notícia da ressurreição de Cristo, que venceu a morte.

Neste sentido, o fato de Isaque ter sido poupado; enquanto Cristo crucificado, não distancia Abraão de Maria.

Tanto Isaque, quanto Cristo, venceram a morte.

E cada um a seu modo.

4 – Abraão foi o Patriarca da antiga Aliança:

“ESTE É O PACTO QUE FAÇO CONTIGO: SERÁS O PAI DE UMA MULTIDÃO DE POVOS.” (Gênesis 17, 4)

Maria é Mãe de Jesus, e Jesus é o caminho, a verdade e a vida. (Jo 14. 5 e 6)

Portanto, Maria é a Mãe da Verdade, do Caminho e da Vida.

Maria é memorial vivo de Cristo em sua humanidade.

Sua pessoa foi o Altar terreno, onde o Verbo celestial se fez carne.

Cristo, ao morrer, a entrega aos cuidados de um dos Apóstolos, e lhe diz: “FILHO, EIS AÍ TUA MÃE.”

E diz a Maria, em relação ao Apóstolo: “MULHER, EIS AI O TEU FILHO.”

“E DESDE AQUELA HORA O DISCÍPULO A RECEBEU EM SUA CASA.” (João 19, 27)

Ora, CASA é uma figura da IGREJA:

E SUA CASA SOMOS NÓS, CONTANTO QUE PERMANEÇAMOS FIRMES ATÉ O FIM, PROFESSANDO INTREPIDAMENTE A NOSSA FÉ E UFANOS DA ESPERANÇA QUE NOS PERTENCE.” (Hebreus 3, 6)

SABEMOS, COM EFEITOS, QUE AO SE DESFAZER A TENDA QUE HABITAMOS NESSE MUNDO, RECEBEMOS UMA CASA PREPARADA POR DEUS E NÃO POR MÃOS HUMANAS, UMA HABITAÇÃO ETERNA NO CÉU.. (II Coríntios 5, 1)

Por isso, ela é Mãe da Igreja, porque é Mãe do Corpo de Cristo; e a IGREJA é o CORPO DE CRISTO:

“CRISTO É O CHEFE DA IGREJA, O SEU CORPO, DA QUAL ELE É O SALVADOR.” (Efésios 5, 23)

“A MATERNIDADE DE MARIA, PARA A IGREJA, É O REFLEXO E O PROLONGAMENTO DE SUA MATERNIDADE PARA COM O FILHO DE DEUS.””  (Leão Magno, Tractatus 26, de Natale Domini, 2: CCL 138, 126)

O Matriarcado de Maria, assim como o Patriarcado de Abraão, marcam a participação do gênero masculino e feminino na Aliança com Deus, para que esta aliança com a humanidade fosse plena.

 


 

[1]Eclesiástico 42:14 – “Um homem mau vale mais que uma mulher que faz bem, mas que se torna causa de vergonha e de confusão.” E haviam penas morais, severíssimas, das quais estavam excluídos os homens: “Deuteronômio 22:20-21 – “Porém, se a virgindade não se achou na moça, Então levarão a moça à porta da casa de seu pai, e os homens da sua cidade a apedrejarão até que morra; pois fez loucura em Israel, prostituindo-se na casa de seu pai. assim tirarás o mal do meio de ti.”

[2] O primeiro filho natural de Abraão é Ismael, filho da escrava. Mas os direitos à Primogenitura Legal foram dados em favor de Isaque, do qual viria a linhagem ancestral do Salvador: Deus respondeu-lhe: “Sara, tua mulher que dará à luz um filho, ao qual chamarás Isaque. Farei aliança com ele, uma aliança que será perpétua para sua posteridade depois dele.” (Gn 17. 18 e 19)

[3]TEÓFILO. De Antioquia. Carta Apostólica. Cap. 14, 1-4. Anos 169/170.

[4]“Todas essas pessoas morreram com fé, sem ter recebido as coisas que lhes foram prometidas. No entanto, eles os viram e os receberam de longe.” (Hebreus 11,13)

[5] “O Senhor disse a Abraão: “Por que se riu Sara, dizendo: ‘Será verdade que eu teria um filho, velha como sou? E Respondeu ao senhor: “Será isso porventura uma coisa muito difícil para Mim?” (Gênesis 18. 11, 12, 13, 14)

[6] “AGORA SEI QUE TEMES A DEUS, POIS NÃO ME RECUSASTES TEU PRÓPRIO FILHO, TEU ÚNICO FILHO.” (Gênesis 22. 11, 12 e 16) Então disse Maria: “EIS AQUI A SERVA DO SENHOR. FAÇA-SE EM MIM SEGUNDO A TUA PALAVRA.” E o anjo afastou-se dela. (São Lucas 1, 38)

[7] “Todas as famílias da terra serão benditas em ti”. Há nisso, uma promessa implícita de que o Salvador viria da descendência de Abraão.

[8] […] e os patriarcas; deles des­cende Cristo, segundo a carne, (Romanos 9, 5)

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