SERIA JUSTA UMA CONDENAÇÃO ETERNA?

1 – Parece que não seria justa a condenação eterna do pecador1, pois toda pena deve ser proporcional ao delito, e sendo toda ação delituosa finitiva no tempo, por qual motivo sua pena haveria de ser eterna?

2 – No mais, se Deus não se lembrará dos nossos pecados,2 a punição eterna ocorrerá sem que o Justo Juiz tenha a recordação dos motivos pelos quais nos pune.

3 – Além disso, todo efeito cessa com o cessar de sua causa, razão porque, a punição haveria de se encerrar num tempo razoável, quando o castigo já se mostrasse satisfatório a reparar o dano causado.

4 – Por fim, nem todo pecado é contra Deus, já que podemos pecar contra nosso semelhante, e considerando que o pecado contra Deus permaneça eternamente porque o ofendido é eterno e imortal, isso não se aplica ao pecado contra o próximo, cuja dor e dano por ele sofridos se encerrarão no findar de sua vida.

MAS EM CONTRÁRIO, sendo eterna a Justiça de Deus, eterna será tanto a alegria do salvo, quanto a perdição do pecador não arrependido:

ELE CRIOU TUDO PARA SUA EXISTÊNCIA; NENHUM PRINCÍPIO É FUNESTO, E A MORTE NÃO REINA SOBRE A TERRA PORQUE A JUSTIÇA É IMORTAL.” (Sabedoria 1. 14 e 15)

SOLUÇÃO:

O pecado é toda ofensa contra a consciência, o amor, a ordem e as leis eternas de Deus.

Decorre do apego perverso à desordem natural, que coloca a vontade individual em desalinho com a vontade Divina.

É qualquer ato pensado, dito ou feito contra Deus, ou que não tenho Deus como propósito principal,3 colocando o ser humano e a Divindade em lados opostos, em inimizade, mesmo após a morte do pecador.

Por isso é necessário em vida, um movimento racional de fé chamado arrependimento, para apagar as transgressões e nos reconciliar com o Criador para que possamos usufruir da felicidade eterna:

SEMPRE SOU EU QUEM DEVE APAGAR TUAS FALTAS, E NÃO MAIS ME LEMBRAR DE TEUS PECADOS.” (Isaías 43, 25)

O pecado que nos condena só finda pelo perdão, só deixando de existir pela misericórdia Divina.

Todo insulto contra Deus, QUANDO NÃO PERDOADO, torna-se perpétuo e irreparável mesmo após a morte do pecador, no que se responde as questões:

1 – Acaso os efeitos de um assassinato findam no momento em que o assassino encerra o ato de matar?

E o ato do que estando no leito de morte, amaldiçoa Deus? Ele tem seus efeitos cessados na morte do esvaído?

Ora, TODO AQUELE QUE AMALDIÇOAR O SEU DEUS LEVARÁ O SEU PECADO.” (Levítico 24, 15)

Portanto, é certa esta ciência, de que todo pecado contra Deus, embora finitivo na prática, é infinito em seus efeitos, e se não perdoado, nem reparado por Cristo, será a mácula que o pecador carregará para sempre na sua história com Deus, e também em sua alma, feita imortal, por estar sujeita a Justiça Divina que é imortal.

Nada justifica dar uma pena finita para um dano infinito, o qual consiste numa agressão grave contra Deus, sem que o pecador tivesse sido alcançado pelo remorso e desejo de ser perdoado:4

Por isso:

(…) OS CONDENADOS IRÃO PARA O CASTIGO ETERNO, E O JUSTOS PARA A VIDA ETERNA.” (São Lucas 13. 28)

“O HOMEM SERÁ PRESO POR SUAS PRÓPRIAS FALTAS, E LIGADO COM AS CADEIAS DE SEU PECADO.” (Provérbios 5, 22)

2 – Deus não mais se lembrará dos pecados perdoados.

Todavia, a lembrança dos pecados impenitentes que ainda o ofendem permanecerá, deixando o pecador, após a morte, preso ao mal que produziu em vida, como diz a Escritura:

DIANTE DE MIM ESTÁ SEMPRE O MEU PECADO. (Salmo 50,5)

(…) PORQUE DESPREZOU A PALAVRA DO SENHOR E VIOLOU O SEU PRECEITO; SERÁ CORTADO E LEVARÁ O PESO DE SUA INIQUIDADE”.(Números 15, 31)

LAVARAM AS SUAS VESTES E AS ALVEJARAM NO SANGUE DO CORDEIRO. (Apocalipse 7, 14)

“MAS, SE NÃO LAVAR AS VESTES E O CORPO, LEVARÁ SOBRE SI A SUA INIQUIDADE”. (Levítico 17, 16)”

3 – Não é regra absoluta a extinção da causa coincidir com a extinção do seu efeito.

O nascimento do filho tem como causa a união entre pai e mãe, e embora a ação que o tenha causado já não exista no tempo, é certo que o efeito, a nova vida, continuará existindo.

Ofender a um ser eterno, significa ofendê-lo na eternidade, e o pecado não perdoado perpetuará sobre o pecador a Justiça Divina:

A mácula do pecado subsiste na alma, mesmo depois de cessado o ato. E a razão é que a mácula implica a falta de luz, pela privação da luz da razão ou da lei Divina. Portanto, enquanto o homem ficar fora dessa luz, nele subsiste a mácula; mas, quando voltar à luz, o que se dá pela graça, então cessará a mácula. Embora cesse o ato do pecado pelo qual o homem se afastou da luz, nem por isso volta imediatamente ao estado anterior; mas, para tal é necessário um movimento da vontade contrário ao primeiro movimento. Assim como quem se distanciar de outrem, por um movimento, deste não fica próximo imediatamente com o cessar do movimento, mas é preciso que se aproxime, voltando por um movimento contrário.” (Suma Teológica. Q 86, DO PECADO E SUA MÁCULA, art. 2º Livro Ia e IIas Pars)

4 – Pecar é sempre ofender a Deus, ainda que seja no próximo, pois homem e mulher são imagens de Deus, e o pecado contra a imagem é também contra o modelo:

(…) PEQUEI CONTRA TI, CONTRA TI SOMENTE,’ (Salmo 51. 4)

Logo, os efeitos do pecado contra o próximo não deixarão de existir pela morte do pecador ou do ofendido.

Fosse possível extinguir o pecado pelo morte do pecador ou do ofendido, o sacrifício de Cristo para nos salvar seria dispensável.

Nenhum pecado se desfaz por si só, senão, somente por aquele que tem o poder de apagá-lo pelo perdão.

Toda ofensa cometida contra Deus, se não perdoada em vida, tornar-se-á perpétua, e onde não houver ofensa perdoada, haverá justiça não cessada.

E por estar sujeita à justiça eterna de Deus, seja para premiar ou punir, é que a alma humana tornou-se imortal.


1 BECARRIA, Cesare. Dos Delitos e Das Penas. 

2 Sempre sou eu quem deve apagar tuas faltas, e não mais me lembrar de teus pecados.* (Isaías 43, 25)”

3 Suma Teológica. AQUINO. Tomás. Livro.

4 A santidade infinita de Deus não deve repelir eternamente um ser que jaez no estado eterno de pecado? Ora, tal é o réprobo no inferno.” […] “Escolheste loucamente a morte e o mal; então estareis permanentemente na morte e no mal que livremente escolheste; […] O MAL E ELE SÃO INSEPARÁVEIS. “Pergunto-vos: não será rigorosamente justo que se aplique um castigo imutável para uma perversidade imutável? No inferno, os condenados já não têm tempo, nem a Graça de se arrepender, e não podem ser perdoados, e por isso, devem necessariamente sofrer um castigo imutável e eterno. (O Inferno? Liv. Catholica Portuense, p. 57, ano 1.905)”

O QUE É A ALMA?

 

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