1 – Parece que Deus, na Pessoa do Filho Divino Jesus Cristo, não poderia ter morrido na cruz, pois um dos atributos da Divindade é a imortalidade, e ser Deus é ser imortal1, tanto quanto ser imortal significa ter a vida eternamente preservada.
2 – Além disso, sabe-se que a morte do corpo humano é consequência do pecado2, e sendo Deus feito homem impecável, por óbvio nunca poderia experimentar a morte.
MAS EM CONTRÁRIO:
Jesus que se tornou homem sem deixar de ser Deus imortal,3 ressuscitou,4 sendo que só pôde ressuscitar porque havia morrido.
Acrescenta-se, que ressuscitar por si mesmo, e por mérito próprio, é ato de poder Divino, e só o pratica quem é Deus, do que se conclui que se Deus ressuscitou, Deus morreu na Pessoa Divina de Cristo.
SOLUÇÃO:
Para compreender que Deus, mesmo sendo imortal, morreu na cruz, é necessário antes entender que tal qual a imortalidade, a onipotência que é o poder absoluto de fazer todas as coisas5 sem as limitações da matéria ou da lei natural, é de igual modo atributo da Divindade.
Nenhuma criatura tem o domínio sobre a vida e a morte, não podendo nascer quando desejar, nem abrir mão da vida, e recuperá-la quando bem lhe aprouver.
Mas para o agente que tudo pode, morte e vida estão totalmente sob seu comando, e é ele quem determina o tempo, o modo e a forma com que esses fenômenos acorrerão, nos outros, ou em si próprio,6 podendo assim, nascer mesmo já existindo, ou morrer sem perder o governo soberano sobre sua própria vida, para então recuperá-la quando quiser e lhe convier, pois como disse Cristo, de si:
“[…] EU SOU O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA,7” no que se responde as questões.
1 — Um ser é mortal quando está sujeito perder a vida sem a capacidade de retomá-la por vontade, ato ou mérito próprio.
Já o imortal é o que detém o poder pleno sobre a vida e a morte, e mesmo experimentando morrer, Cristo não perdeu o poder sobre a sua própria vida, nem se deixou dominar pela morte,8 tanto que retomou sua vida das mãos dela, pois diz a Escritura que ele “ressuscitou” e não que fora “ressuscitado.”9
O imortal tem nele o poder da vida eternamente preservada, mesmo que não viva por um certo período no tempo e na história, de igual modo ao proprietário que preserva o domínio e posse sobre seu automóvel, mesmo quando não esteja usando o seu veículo.
Assim, Cristo, por meio da Divindade do Pai, que estava nele consubstancialmente, e mesmo se dando a morrer, preservou em si o poder soberano sobre sua vida, não se sujeitando ao domínio da morte.
2 — Não sendo Cristo, um homem comum, por conta de sua humanidade unida inseparavelmente à mesma Divindade que há em Deus Pai, é certo que assumiu por vontade própria, e temporariamente, algumas fraquezas do corpo humano, como dor, sede e morte, sem que isso fosse resultado do pecado, mas porque convinha ao sacrifício na cruz, que padecendo na dor, sede e morte, desse redenção a humanidade, pois como disse:
ERA NECESSÁRIO QUE SOFRESSE TODAS ESSAS COISAS E ASSIM ENTRASSE NA SUA GLÓRIA. (São Lucas 24, 26)
Cristo assumiu essas fraquezas humanas, porque assumiu na cruz, e sem culpa, o castigo de toda humanidade, para que a humanidade, culpada, pudesse ser isentada de todo castigo.10
1 Não sois vós, Senhor, desde o princípio, o meu Deus, o meu Santo, O IMORTAL?” (Habacuque 1, 12)
2 Porque O SALÁRIO DO PECADO É A MORTE,” (Rm 6, 23) “”porque és pó, e pó te hás de tornar”.” (Gênesis 3, 19)
3 E é notório que nosso Senhor nasceu da tribo de Judá, tribo à qual Moisés de nada encarregou ao falar do sacerdócio. Foi constituído não por prescrição de uma Lei humana, MAS PELA SUA IMORTALIDADE. (Hebreus 7. 14 e 16)
4 Mt 28, 6
5 […] “porque para Deus NADA É IMPOSSÍVEL.” (Lc 1, 37)
6 “A nossa cidadania, porém, está nos céus, de onde esperamos ansiosamente o Salvador, o Senhor Jesus Cristo. PELO PODER QUE O CAPACITA A COLOCAR TODAS AS COISAS DEBAIXO DO SEU DOMÍNIO, ele transformará os nossos corpos humilhados, tornando-os semelhantes ao seu corpo glorioso.” (Filipenses 3. 20-21)
7 Jo 14. 6.
8 […] pois sabemos que Cristo, tendo ressurgido dos mortos, já não morre, nem a morte terá mais domínio sobre ele. (Romanos 6, 9)”
9 E, chegando-se Jesus, falou-lhes, dizendo: É ME DADO TODO O PODER NO CÉU E NA TERRA. (São Mateus 28. 18)”O Senhor ressuscitou verdadeiramente e apareceu a Simão”. (São Lucas 24, 34)”
10 Explica Santo Tomás: “[…] assumiu a natureza humana SEM PECADO, na pureza que ela tinha no seu Estado de Inocência, e do mesmo modo, poderia ter assumido a natureza humana sem as suas misérias. Por onde, é claro que Cristo não contraiu as referidas fraquezas, como se as tivesse em CONSEQUÊNCIA do pecado, MAS POR VONTADE PRÓPRIA. (Suma Teológica, Q 14, art. 3. Tratado do Verbo Encarnado)”“[…] há misérias comumente existente em todos os homens, como a fome, a sede e outras tais. E todas essas Cristo ASSUMIU SEM DESONRA. ” (Suma Teológica, Q 14, art. 1. Tratado do Verbo Encarnado)