Tudo que Cristo realizou enquanto habitou no tempo conosco, foi, e ainda é necessário à nossa salvação. Dos pequenos gestos ao grandioso sacrifício; das manifestações de docilidade à ira; de sua fragilidade humana aos mais extraordinários dos milagres, absolutamente nada Ele instituiu que tenha restado obsoleto, inútil ou exagerado.
Neste compasso, é fato que Cristo inaugurou o Batismo nas Águas.
Não por outra razão, o cuidado de Deus em antecipar nas profecias, a boa nova da purificação do ser humano mediante um sinal produzido nas águas: “Então, ASPERGIREI ÁGUAS PURAS sobre vós, e ficareis purificados de todas as imundícies e de todos os vossos ídolos VOS PURIFICAREI.” (Ezequiel 36.25) “E mostrou-me o RIO PURO DA ÁGUA DA VIDA, claro como cristal, QUE PROCEDIA DO trono de Deus e do CORDEIRO.”(Apocalipse 22.1)
O Batismo recolhe a sua eficácia salvífica do sacrifício e da ressurreição de Cristo.
O Batismo é o sacramento que nos configura, e nos molda à paixão e ressurreição do Cordeiro de Deus, martirizado para redenção da nossa culpa.
“E vós, com alegria, tirarei ÁGUAS da fonte da SALVAÇÃO.” (Isaías 12.3)
Assim como preanunciaram os antigos profetas, também Jesus se anunciou nas águas, não apenas se predizendo, mas manejando milagres, sinais e prodígios por meio delas.
Cristo andou sobre ÁGUAS, e também realizou o primeiro ato de seu ministério redentor, e ainda o seu primeiro milagre nas bodas de Caná, transformando ÁGUA em vinho. (São João 2. 1-11)
Ele também adentrou nas ÁGUAS do rio Jordão, santificando-as em seu corpo humano sobrenatural, dotando através delas, as águas de todo mundo do seu poder e benção, transformando o Batismo meramente simbólico que São João Batista realizava (e que trazia a água apenas como elemento pedagógico), num sacramento que tem na matéria líquida, o meio eficaz de comunicação de sua Graça à toda humanidade, num sinal do seu Corpo Santíssimo que futuramente seria sacrificado na cruz.
Ora, nesses episódios, denotamos a Graça Divina se manifestando por intermédio das águas.
O Espírito incriado, agora se manifesta através da matéria criada. Esse é o princípio geral e efeito universal da Encarnação do Verbo. A Divindade eterna (Deus) age agora através da matéria criada (Humanidade).
“AS ÁGUAS TE VIRAM, Ó DEUS, as águas te viram, e tremeram.” (Salmo 77. 16)
“LANÇA O TEU PÃO SOBRE AS ÁGUAS.” (Eclesiastes 11.1)
Logo, é indiscutível que o próprio Deus revelou a sua Igreja Apostólica, que o Batismo tiraria sua eficácia salvífica do próprio sacrifício de Jesus, como ainda ensinou Santo Tomás de Aquino:
“[…] o Batismo haure do próprio Cristo […] para nos configurarmos com sua morte e ressurreição”. (Suma Teológica. Q 69, art. 1° Dos Efeitos do Batismo)
“Este habitará nas alturas, as fortalezas e rochas serão o teu refúgio, e seu pão lhe será dado, as SUAS ÁGUAS SERÃO CERTAS. ” (Isaías 33. 16)
Também expeliu de seu Santíssimo Corpo sacrificado, sangue e ÁGUA, como está escrito:
“EI-LO JESUS CRISTO, AQUELE QUE VEIO PELA ÁGUA e pelo sangue; (I São João 5. 6)”
“Naquele dia também acontecerá, que SAIRÃO DE JERUSALÉM ÁGUAS VIVAS.” (Daniel 12.7)
Leciona a Santa Tradição:
“Do lado de Cristo manou a água para lavar e o sangue para remir.1 Por isso, o sangue é apropriado ao sacramento da Eucaristia, e a água ao Batismo.” (Suma Teológica. Q 69, art. 3° Dos Efeitos do Batismo)
Sendo a água, o elemento do início de toda vida natural, seria agora em Cristo, o início de toda vida sobrenatural, pois o corpo é o espelho da alma, de igual modo que a alma espelha o corpo, do que se conclui que o Batismo, sendo o nascimento espiritual, correspondente ao nascimento natural.
Quem NÃO nasce do Espírito NÃO PODE sobreviver no espírito; assim como quem NÃO É gerado num corpo, NÃO PODE sobreviver num corpo, razão porque, o nascimento espiritual de um membro do Corpo de Cristo só acontece nas águas:
“QUEM NÃO RENASCER DA ÁGUA e do Espírito NÃO PODERÁ ENTRAR NO REINO DE DEUS. (São João 3, 5)”
Como ensinou o Doutor Angélico:
“Abrir as portas do reino celeste significa remover o obstáculo que nos impede de entrar nele. (Santo Tomas in Suma Teológica, Q 69)”
E também São Cirilo de Alexandria, nos anos 300 DC:
“A água que Eu lhe der tornar-se-á nele uma nascente de água a jorrar para a vida eterna» (Jo 4, 14). Porque a água está na base de tudo; porque a água produz a vegetação e a vida; porque a água desce do céu sob a forma de chuva; porque, caindo sob uma única forma, ela atua de maneira multiforme. […] Ela é uma coisa na palmeira e outra na vinha, mas dá-se inteiramente a todos. Tem apenas uma maneira de ser e não é diferente de si mesma. A chuva não se transforma quando cai aqui ou ali mas, ao adaptar-se à constituição dos seres que a recebem, produz em cada um deles aquilo que lhe convém.” (Catequese Baptismal. par. XVI. Trad. Breviário)
Esse primeiro obstáculo é o pecado original, cuja revogação não depende da vontade, nem da escolha humana, mas tão somente da ação direta do próprio Deus em cada um de nós.
“Esse obstáculo é a culpa por nossa condição de réu diante de Deus, por onde, consequentemente, o Batismo produz o efeito de nos abrir as portas do céu.” (Suma Teológica. Q 69, art. 7°Dos Efeitos do Batismo)
“Porque, assim como, em Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados em Cristo.” (1 Co 15. 22)
“Somos como impuro, todos nós.” (Isaías 64.6)
“Sei que SOU PECADOR DESDE QUE NASCI.” (Salmo 51.4-9)
Se da imperfeição da natureza adâmica veio a doença do pecado que nos coloca como réus condenados diante de Deus desde o primeiro dia de nossas vidas, da natureza perfeitíssima na qual o Verbo se Encarnou, veio o remédio que nos cura, o qual reside na própria Humanidade do Cristo:
“PURIFICA-ME COM HISSOPO2, e ficarei puro. LAVA-ME, e mais branco do que a neve serei. Faze-me ouvir de novo júbilo e alegria, e os ossos que esmagaste exultarão. Esconde o rosto dos meus pecados e APAGA todas as minhas INIQUIDADES.” (Salmo 51.4-9)
Abertas as portas do céu pelo Batismo, podemos agora caminhar, nos deixando mover pela Graça de Deus no Caminho que é Jesus3, o qual nos levará à adentar por essa porta, para que possamos obter uma vida eterna contemplativa junto ao Criador.
Batismo é a EXTENSÃO ATÉ NÓS DO SACRIFÍCIO DE JESUS que nos livra dos pecados. O pecado original trouxe um abismo intransponível entre Deus e a raça humana, gerado por nossa reprovação diante Dele, o que só se remove pela ação do próprio Deus sacrifico.
“Todos os que FOSTES BATIZADOS, FOSTES REVESTIDOS DE CRISTO.” (Gálatas 3, 27)
O seu Espírito Divino, assim como sua Humanidade Santa, imolada e incorrupta, nos são participados mediante sinais da crucificação, dentre eles, o sinal produzido na ÁGUA: “Eis o Cordeiro de Deus, que retira o pecado do mundo. (São João 1, 29)” “Contudo um dos soldados lhe furou o lado com uma lança, e logo SAIU SANGUE E ÁGUA. (São João 19. 34)” “Ou ignorais que todos os que fomos batizados em Jesus Cristo, FOMOS BATIZADOS NA SUA MORTE? (Romanos 6, 3)”
A água enquanto matéria, testemunha a Onipresença da natureza humana do Cristo, estando no sacramento como antídoto contra o pecado que contamina a carne, impedindo a salvação e a ressurreição4 do corpo: “Felizes aqueles que LAVAM AS SUAS VESTES5 para ter direito à árvore da Vida e poder ENTRAR NA CIDADE PELAS PORTAS. (Apocalipse 22, 14) “Permanecemos nesta tenda6 gemem os oprimidos: desejamos ser não despojados, mas REVESTIDOS com uma VESTE NOVA POR CIMA DA OUTRA, de modo que o que há de mortal7 em nós seja absorvido pela vida. (II Coríntios 5, 4)”
Emblemática são algumas prefigurações do Batismo nas antigas Escrituras, em especial nas ÁGUAS DE MERIBÁ:
“Porque nos fizeste sair do Egito e nos trouxeste a este péssimo lugar, em que não se pode semear e onde não há figueira, nem vinha, nem romãzeira, e tampouco há água para beber? Apareceu-lhes a glória do Senhor, e o Senhor disse a Moisés: Toma a TUA VARA e convoca a assembleia, tu e teu irmão Aarão. Ordenareis ao rochedo, diante de todos, que dê as suas águas; FARÁS BROTAR A ÁGUA DO ROCHEDO E DARÁS DE BEBER À ASSEMBLEIA e aos seus rebanhos.Tomou Moisés a vara que estava diante do Senhor. Em seguida, tendo Moisés e Aarão convocado a assembleia diante do rochedo, disse-lhes Moisés: – Ouvi, rebeldes: acaso faremos nós brotar água deste rochedo? Moisés levantou a mão e FERIU O ROCHEDO COM A SUA VARA duas vezes; as águas jorraram em abundância, de sorte que beberam, o povo e os animais. Em seguida, disse o Senhor a Moisés e Aarão: Estas são as águas de Meribá, onde os israelitas se queixaram do Senhor, e onde este fez RESPLANDECER A SUA SANTIDADE. (Números 20. 5-13)”
A água que brotou do rochedo, prefigurou a água do Batismo, porque:
Um: rocha é uma das figuras de Cristo no Antigo Testamento8;
Dois: a água fluiu da rocha após ser ferida com cajado, como a água que escorreu do Cristo após ter sido ferido com uma lança;9
Três: foi dada a toda assembleia10 de Israel que prefigurou a Igreja;
Quatro: evitou a morte do povo que perecia com sede no deserto, assim como o Batismo evita a morte daquele que jaz no deserto do pecado original;
E cinco: fora extraída pelo cajado de Arão, que figurou o Sacerdócio11 e a Autoridade de Cristo, dados a sua Igreja.
A água Batismal é a extensão do Corpo de Cristo, cuja Humanidade Onipresente nos é comunicada, iniciando assim, o processo de santificação necessário à salvação. Negar-se ao Batismo ou negá-lo a terceiros impedirá por certo que o dom sobrenatural da fé, coberto pelo pecado original, possa destapar e progredir rumo à Caridade12, trazendo a comunhão perfeita com o sacrifício do Cordeiro, como está escrito:
“[…] FORMAMOS UM SÓ CORPO EM CRISTO.” (Romanos 4.5)
“[…] Há um só Corpo, e UM SÓ BATISMO.” (Efésios 4.4)
“Aquele que CRER E FOR BATIZADO, SERÁ SALVO.” (São Marcos 16, 16)
Livrados pecado original no qual morríamos, renasceremos com capacidade e disposição para comunhão e participação (em Ciência e Virtudes) com Deus, sem a culpa (reprovação) que impede de nos apresentarmos justos diante do Juízo Divino: “Fomos, pois, sepultados com Ele em sua morte pelo Batismo, para que como Cristo ressurgiu dos mortos pela glória do Pai, assim nos também vivamos UMA NOVA VIDA. (Romanos 6, 4)” “Ele NOS SALVOU mediante o BATISMO DE REGENERAÇÃO E RENOVAÇÃO pelo Espírito Santo. (Tito 3, 5)”
“Acheguemos a Ele com o coração sincero, com plena firmeza da fé, o mais íntimo da alma ISENTO de toda mácula de PECADO e o corpo LAVADO COM ÁGUA PURIFICADORA. (Hebreus 10, 22)”
“QUEM NÃO NASCER DE NOVO NÃO PODERÁ VER O REINO DE DEUS. (São João 3, 4)” “Aquele que NÃO RENASCER DA ÁGUA e do Espírito, não poderá ver o Reino de Deus. (São João 3.3,3)”
Não se pode transpor o estado de separação com Deus apenas por nossas virtudes intelectuais ou devocionais, pois não nos é dada a salvação por nossa própria nossa conta e mérito. Buscar por nossos atos extirpar o pecado original, seria um inútil esforço humano ou religioso, porque É IMPOSSÍVEL CONFESSAR O PECADO ORIGINAL para obter o perdão.
Infelizmente, doutrinas não apostólicas,13 nunca antes ensinadas ou defendidas pelos apóstolos negam o caráter salvífico do Batismo, transformando-no num mero ritual “simbólico” de “testemunho público” para ingresso em confrarias ou seitas, contrariante o que o Magistério Infalível ensina há mais de dois mil anos, cuja síntese pode ser extraída da visão tomista: “A remissão de nenhum pecado pode ser dar, senão pela Paixão de Cristo; sem efusão de sangue não há remissão […] Todos que fomos batizados, fomos batizados em sua morte, de onde é claro que pelo Batismo morremos pela vetustez do pecado e recomeçamos a viver na novidade da Graça. (Suma Teológica Q 69, art. 1º Do Batismo)”
A água escorreu do pericárdio de Cristo na cruz, é, portanto, um sinal sagrado do Batismo, provindo diretamente do seu Santíssimo sacrifício. (Jo 19. 34; Hb 2, 14)
1 Remir significa retirar a culpa do culpado, no caso, volver o ser humano a condição de inocência perdida pelo pecado dos primeiros pais. Lavar significa purificar, nos isentando dos efeitos destrutivos do pecado que nos macula diante de Deus.
2 Planta da família do hortelã, usado pelos antigos judeus para respingar, espalhar, aspergir água para limpeza de objetos sagrados, também usada nas cerimônias sionistas para aspersão de sangue.
3 Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. (Jo 14.6)
4 Sepultados com Ele em sua morte pelo batismo, para que como Cristo ressurgiu dos mortos pela Glória do Pai, assim nós também vivamos uma vida nova. (Romanos 6, 4) “Ei-lo Jesus, aquele que veio pela água e pelo sangue, não só pela água, mas pela água e pelo sangue. O Espírito, a água e o sangue: estes três dão o meu testemunho. (I Jo 5. 6-8)” Testemunhar é provar de modo visível.
5 Vestes é cobertura exterior, figura do corpo natural. Entrar na cidade, ou seja, entrar na Cidade Santa Celestial.
6 Velha tenda ou corpo velho corrompido. Já veste nova é o corpo purificado do pecado original, para a ressurreição.
7 O pecado original.
8 Deus é a minha rocha onde encontro o meu refúgio, meu escudo e força de minha salvação, minha cidadela e meu refúgio. (II Sm. 22,3)”
9 Jo 19.34.
10 Ekklesia ou Igreja no grego koiné da Septuaginta.
11 CRISTO, o Sumo Sacerdote, delega aos Apóstolos, para que fosse transmitido aos seus sucessores diretos, não havendo autoatribuição desse Dom: – “Eu vos dou o sacerdócio, como dom ministerial, e o estranho que se chegar será morto. (Nm 17. 25-28 e 19. 1-7) e ainda: “ninguém toma para si esta honra, senão quando é chamado por Deus, como o foi Aarão.” (Hb 5,1-6). Os Apóstolos, “Conforme iam passando pelas cidades, iam também entregando, para que observassem, as decisões tomadas pelos Apóstolos e presbíteros em Jerusalém” (Atos 16,4). “
12 A Caridade não pratica o mal contra o próximo. Portanto, a Caridade é o pleno cumprimento da lei. (Rm 13, 10)” Só pelo Dom Espiritual da Caridade podemos cumprir perfeitamente o segundo Preceito da Graça: “Amar ao próximo como a nós mesmos. (Mt 12, 31)”
13 Anabatismo, movimento cismático emergindo nos anos 1.535 em Zurique, Suíça. Negavam o pecado original, e portanto, o Batismo infantil, e defendiam o rebatismo, e o batismo como mero elemento simbólico, apenas por imersão.