1 – Parece que basta saber que Jesus salva e desejar essa salvação para sermos salvos, pois se o objeto da fé é a verdade, quem tem consciência de Cristo, tem a verdade.
2 – Por conseguinte, supõe-se dos que tem essa noção intelectual, que não importam seus atos ou práticas[1], pois o que vale é apenas a consciência que nos permite confiar em receber a promessa da salvação.
MAS EM CONTRÁRIO:
VOCÊ CRÊ QUE EXISTE UM SÓ DEUS? MUITO BEM! ATÉ MESMO OS DEMÔNIOS CRÊEM — e tremem!” (Tiago 2.19)
SOLUÇÃO:
A fé é a luz Divina que ilumine nossos passos rumo ao futuro, e nos torna unos em Deus.
É espelharmos não apenas naquilo que Cristo ensinou, mas, principalmente, no que realizou e praticou:
“A fé, que recebemos de Deus como dom sobrenatural, aparece-nos como luz para a estrada, orientando os nossos passos no tempo. É a luz duma memória basilar — a da vida de Jesus – onde o seu amor se manifestou plenamente fiável, capaz de vencer a morte. Luz que descerra diante de nós horizontes grandes e nos leva a ultrapassar o nosso «eu» isolado, abrindo-o à amplitude da comunhão.[2]
São as nossas atitudes, posturas e condutas que podem nos abrir ou nos fechar para a luz Divina.
“A fé nasce no encontro com o Deus vivo, que nos chama e revela o seu amor: um amor que nos precede e sobre o qual podemos nos apoiar para construir solidamente a vida[3].”
Fé, é a luz de Deus, que ilumina todo nosso ser, desde o intelecto até as nossas ações concretas:
“(…) duma fé que faz grande e preenche a vida, centrada em Cristo e na força da sua graça[4],
Logo, não deve estar disposta apenas na consciência ou na vontade de ser salvo, senão, indispensavelmente necessário que também esteja nos atos práticos, decorrentes dessa vontade e dessa consciência:
“A fé cristã está centrada em Cristo, é a confissão de que Jesus é o Senhor e que Deus ressuscitou dentre os mortos. Portanto, a fé cristã é fé no Amor pleno, no seu poder eficaz, e na capacidade de transformar o mundo e iluminar o tempo[5].
Cristo não é Deus de pessoas que só ouvem e pensam, mas que praticam aquilo que ouvem e pensam.
Só a fé plena é capaz de nos dar salvação, através do amor prático, pelo qual conhecemos Deus, e também nos reconhecemos em Deus:
CUMPRE, SOMENTE, QUE VOS MOSTREIS EM VOSSO PROCEDER DIGNOS DO EVANGELHO DE CRISTO; PORQUE A VÓS É DADO NÃO SOMENTE CRER EM CRISTO, MAS AINDA SOFRER POR ELE.” (Filipenses 1. 2-29)
Limitar a fé à consciência sobre a salvação e na vontade de ser salvo é matar o amor, porque o amor não existe na abstração, mas somente na prática, exigindo atos concretos, e só se mostra nas obras de bondade nas quais habita.
Mas se a fé não consegue transcender à realidade prática, limitando-se numa noção teórica, então, não poderá iluminar a realidade de nossas vidas, sendo deficiente, imperfeita e tão frágil que não move a vontade à agir conforme aquilo que crê o intelecto.
A fé nos propõe mudança de vida e de desejo.
Nos atos de bondade, somos feitos imitadores de Cristo:
“Dou-vos um novo mandamento: Amai-vos uns aos outros. Como eu vos tenho amado, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros.” (São João 13, 34)
Assim, é próprio da fé toda atitude de renúncia a nós mesmos, naquilo que nos afasta do Amor que constrói pontes; e nos conduz ao ódio que as destrói, no que responde as questões:
1 – Nenhuma verdade se constrói só pela ideia, como nenhuma realidade se constrói apenas com a vontade ou pelas noções puramente do intelecto invisível, senão, quando tais ideias e noções, produtos da vontade, estejam dispostas na realidade visível da nossa existência:
“Temos de Deus este mandamento: o que amar a Deus, ame também a seu irmão.” (I São João 4, 21)
A Verdade Divina se fez homem para ser visto e interagir concretamente conosco, realizando por meio da natureza humana, as ações práticas de amor e misericórdia através das quais a vontade Divina nos modela.
Buscar a Verdade Divina, implica encontrá-la, e uma vez encontrada, necessário interagir dentro dessa Verdade, para que dela não estejamos excluídos:
“Se alguém disser: “Amo a Deus”, mas odeia seu irmão, é mentiroso. Porque aquele que não ama seu irmão, a quem vê, é incapaz de amar a Deus, a quem não vê.” (I São João 4, 20)
“Enquanto, pois, subsiste a promessa de entrar no seu descanso, tenhamos cuidado em que ninguém de nós corra o risco de ser excluído.” (Hebreus 4, 1)
O papel da fé é mover a vontade à realizar por meio de obras reais, o Bem, conforme aquilo que confiou a alma, levada a crer pelo intelecto:
“Porque diante de Deus não são justos os que ouvem a lei, mas serão tidos por justos os que praticam a lei.” (Romanos 2, 13)
Por isso, o objetivo da fé é, eficientemente, transformar a realidade prática das nossas vida:
“Sejam praticantes da palavra, e não apenas ouvintes, enganando-se a si mesmos. Aquele que ouve a palavra, mas não a põe em prática, é semelhante a um homem que olha a sua face num espelho, e, depois de olhar para si mesmo, sai e logo esquece a sua aparência. Mas o homem que observa atentamente a lei perfeita que traz a liberdade, e persevera na prática dessa lei, não esquecendo o que ouviu mas praticando-o, será feliz naquilo que fizer. Se alguém se considera religioso, mas não refreia a sua língua, engana-se a si mesmo. Sua religião não tem valor algum! A religião que Deus, o nosso Pai aceita como pura e imaculada é esta: cuidar dos órfãos e das viúvas em suas dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo.” (S.Tiago 1. 22-27)
2 – A bondade e o amor que estão apenas no intelecto e na vontade não passam de mera cogitação, e não são reais, posto que não vão além de uma simples ilusão ou uma imagem enganosa.
Prática de vida no ódio se opõe a noção mental do que é o amor.
Para se tornarem realidade, é mister atitudes, condutas e posturas que produzam efeitos concretos.
Isto porque, quanto a caridade fixa somente na cogitação, ela não transforma, nem a nós, nem a realidade que nos cerca, sendo, pois inútil.
Sobre o amor, no qual a fé se aperfeiçoa, é dito:
“Não será, pois, mero sentimento afetuoso: será amor generoso, que vá até o sacrifício e esquecimento de si mesmo, até à renúncia da vontade própria pela submissão aos preceitos e conselhos divinos.” (TANQUEREY. Teologia Mística e Ascética. Cap. II, P. 52)
É indispensável que a fé seja tirada do contexto da vontade abstrata e da pura ideia, para que produza os frutos de amor necessários a estabelecer nossa comunhão com Deus, e em comunhão com Deus, estaremos em comunhão com a vida eterna:
“Antes de tudo, mantende entre vós uma ardente caridade, porque a caridade cobre a multidão dos pecados.” (Pr 10,12). (I Pedro 4, 8)
“O poder divino deu-nos tudo o que contribui para a vida e a piedade, fazendo-nos conhecer aquele que nos chamou por sua glória e sua virtude. Por elas, temos entrado na posse das maiores e mais preciosas promessas, a fim de tornar-vos por esse meio participantes da natureza divina, subtraindo-vos à corrupção que a concupiscência gerou no mundo. Por esses motivos, esforçai-vos quanto possível por unir à vossa fé a virtude, à virtude a ciência, à ciência a temperança, à temperança a paciência, à paciência a piedade, à piedade o amor fraterno e ao amor fraterno a caridade.” (I Pedro 1. 1-7)
Quando a fé nos move a realizar boas obras, estas não são méritos nossos, mas méritos de Cristo que por meio de nossas ações, se faz presente nelas:
“Permaneçam em mim, e eu permanecerei em vocês. Nenhum ramo pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira. Vocês também não podem dar fruto, se não permanecerem em mim. Eu sou a videira; vocês são os ramos. Se alguém permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; pois sem mim vocês não podem fazer coisa alguma.” (S. João 15.4-5)
[1] Conforme Tese da Reforma Protestante: “Não podemos, pelas nossas melhores obras, merecer da mão de Deus perdão de pecado ou vida eterna, porque são impuras e misturadas com tanta fraqueza e imperfeição, que não podem suportar a severidade do juízo de Deus; e, assim, depois que tivermos feito tudo quanto podemos, tendo cumprido tão somente o nosso dever, somos servos inúteis.” (Confissão de fé de Westmister, anos 1643-1649)
[2] ENCÍCLICA LUMEN FIDEI. 4.
[3] ENCÍCLICA LUMEN FIDEI. 38.
[4] ENCÍCLICA LUMEN FIDEI.
[5] ENCÍCLICA LUMEN FIDEI. 15.