O PAI NOSSO EXPLICADO.

 

Cristo renovou todas as coisas, inclusive, a maneira pela qual nos dirigimos a Deus, por meio de uma nova oração que elevou à perfeição, tanto a forma, quanto o fim para o qual devamos rezar.

A oração do Pai Nosso é a mais sublime já concebida, pois proclamada pela Excelsa Sabedoria Divina, dos lábios Santíssimos do próprio Verbo de Deus, Palavra Viva que esboçou “a lembrança de todo o seu ensinamento, de tal modo, que nela temos uma síntese de todo Evangelho.(Da Oração. Tertuliano, Cap. I parágrafo I, ano 160-220)

Esta oração não é um modelo a ser completado, porque que tudo que veio de Cristo é perfeito, e ao perfeito, nada lhe falta, sendo esta, uma recitação perene onde todas as palavras são bastantes em si. 

Eis a nossa Oração Divina, conforme o Sagrado Magistério da Igreja:

 

1. “PAI NOSSO. ”

 

Toda dignidade de um Pai está alicerçada em ser reconhecido pelo filho em sua Autoridade paterna.

Inversamente, a grande angústia está em ser rejeitado, e assim, tornar-se órfão dos seus próprios filhos, os quais criou e sustentou.

Essa é a nossa condição diante de Deus, trazida pelo pecado:

Gerei filhos, e estes não me reconheceram. ” (Isaías 1,2)

Não por outra razão, Jesus inaugura a reza instituindo o preceito de que para orar, se comunicar com Deus, há de se reconhecer a Deus primeiro como Pai, para que este, após, reconheça o orante como filho:

“Se o próprio Cristo não nos tivesse permitido orar dessa maneira, nenhum de nós ousaria poder pronunciar o Nome do Pai. ” (São Cipriano de Cartago, o mártir, ano +258, p. 111. Obras Completas. Vol. I) ”

É uma referência a parábola do filho pródigo, que retornou ao Pai, após tê-lo voluntariamente abandonado, tendo o Pai lhe recebido com grande alegria, porque apraz a todo pai, a reconciliação com os filhos rebelados:

Se dizemos que Deus é nosso Pai, precisamos agir como filhos de Deus, para que, do mesmo modo que nos alegramos de Deus Pai, Ele também se alegre de nós. (São Cipriano de Cartago, o mártir, ano +258, p. 111 Obras Completas. Vol. I)

 

2. “QUE ESTAIS NO CÉU. ”

Todo bom pai constrói uma boa casa para morada dos filhos.

Um Pai é suficientemente feliz quando por meio dele se realiza a felicidade plena dos filhos em sua companhia.

Deus é um Pai Perfeito.

Para um Pai Perfeito só poderá haver uma morada perfeita.

Portanto, é próprio de Deus o céu, assim como é próprio do céu, Deus.

Mas não há céu sem Deus, como não existe Deus sem que esteja no céu, sendo forçoso concluir que O CÉU É O PRÓPRIO DEUS, em toda sua dimensão inesgotável e eterna na qual haveremos de fazer morada, sem limite de tempo, espaço, e sem nos limitarmos localmente. A visão perfeita de Deus, que possuem os justos, confere a estes o acesso ao céu, dando-lhes ingresso à moradia do Pai, que pertence aqueles que, por herança de santidade, fizeram-se verdadeiramente filhos.

Há implicitamente uma vedação à morada celestial aos infiéis, por conta da censura a todos aqueles que não desejaram o reconhecimento da filiação Divina, escolhendo livremente servirem a um falso pai, que por conta de sua inautêntica paternidade, não lhes cobra respeito, amor, e nem obediência.

Por isso, o céu não pode servir de morada aos filhos espúrios que rejeitaram livremente ao Pai verdadeiro:

Vós nascestes do diabo, e quereis praticas as concupiscências do vosso pai. Ele foi homicida, desde o princípio, e não permaneceu na verdade, porque nela não há verdade. ” (São João 8.44)

Sendo Deus, um pai misericordioso, há em sua casa muitas moradas para os filhos que se reconciliam com Ele por meio de Cristo, o qual nessa relação, se coloca como Mordomo da Casa Paterna, aquele que limpará e reconstruirá o acesso dos filhos errantes à proteção e felicidade da casa paterna:

“Credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vô-lo teria dito. E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também. ” (São João 14. 1 a 3)

 

3.  “SANTIFICADO SEJA O VOSSO NOME. ”

 

Para ver Deus, há de se ir à Casa de Deus que é o céu.

Mas para isso, necessitamos de ser inseridos na comunhão real da santidade Divina, tornando-nos partícipe dela por obra da bondade Divina:

“Bem-aventurados os LIMPOS DE CORAÇÃO, porque eles verão a Deus. (São Mateus 5.8) ”

A santidade é a virtude que deve ser plantada na terra, para que possa ser colhida no céu, nos garantindo o acesso à morada do pai.

“A cidade não necessita de sol nem de lua para iluminar, porque a glória de Deus a ilumina, e a sua luz é o Cordeiro. NELA NÃO ENTRARÁ NADA DE PROFANO, nem ninguém que pratique abominações e mentiras, mas unicamente aqueles cujos nomes estão inscritos no Livro da Vida. ” (Apocalipse 21. 23 e 27)

Ora, se o Pai é Santo, e se todo filho carrega em si, de certo modo, a imagem do Pai, é correto afirmar que a santificação se realiza do Pai para o Filho. Se nos tornamos filhos de Deus, devemos trazer e levar a imagem do Pai em nós, na realidade dos nossos atos e vida, e não apenas num conceito intelectual irreal:

Quem poderia pretender santificar aquele que já é o próprio Santificador? Não é que pretendamos que Deus seja santificado por nossas orações à Ele, mas sim, lhe pedimos que o seu santo Nome seja santificado em nós.” (São Cipriano de Cartago, o mártir, ano +258, p. 112 Obras Completas. vol. I)

Todavia, como nos santificamos no Santo Nome de Deus, se Deus jamais se identificou nominalmente com uma identidade social e pessoal, sendo que a ninguém fora revelado o seu Nome2? Ora, os nomes têm por função fazer a distinção entre as várias pessoas comuns, para que não as confundamos dentre as iguais.

Mas não há ninguém como Deus, porque Ele é único, razão porque, não há um Nome pessoal em Deus.

Por outro lado, Deus tem por Nome aquilo que Ele É, eternamente.

Os atributos infinitos de Deus (Amor, Piedade, Caridade, Justiça, Poder, Autoridade, Misericórdia, Graça e outros) são os seus NOMES, e dentre os seus Nomes, o que mais lhe predica é o Amor em sua forma ágape ou CARIDADE, 

DEUS É AMOR. ” (São João 1. 4, 1)

EU SOU O QUE SOU.” (Êxodo 3.4)

O MEU AMOR NÃO MUDARÁ. ” (Isaías 54,10)

Os filhos se reconhecem nos pais, e reciprocamente, o Pai se reconhece nos filhos, razão porque, aquele que não tem a Caridade, não tem Deus por Pai.

“Nós conhecemos e cremos no amor que Deus tem para conosco. DEUS É AMOR, E QUEM PERMANECE NO AMOR PERMANECE EM DEUS E DEUS NELE. (I São João 4, 16)

Oramos então, para que esta santificação (pela Caridade) permaneça em nós. ” (São Cipriano de Cartago, o mártir, ano +258, p. 112 Obras Completas. Vol. I)

 

4. “VENHA A NÓS O VOSSO REINO E SEJA FEITA VOSSA VONTADE NA TERRA E NO CÉU. ”

 

Mas aonde estaria o reino de Deus? Indagavam os judeus a Cristo.

Ora, todo reino está aonde repousa o cedro e a coroa de seu monarca, símbolos máximos de toda sua majestade e sua soberana vontade.

Se o reino de Deus é o céu, e não havendo céu sem Deus, nem Deus sem céu, forçoso concluir que o reino de Deus está aonde Ele está. E sendo Deus Onipresente, é certo que esse Divino Reino, se estende por céus e terra, sendo o rei, o único capaz de tornar a terra em céu, e o céu em terra. Mas o reino de Deus também está dentro de cada um de nós, porque quando por Deus fomos gerados, ele nos imprimiu a sua imagem e semelhança. Ora, tudo que traz em si a imagem do rei, faz parte do reino, e também reina junto com o monarca:

Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que ele reine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos os répteis que se arrastam sobre a terra”. (Gênesis 1, 26)

Foi pela imagem de Deus em cada um de nós, que esse reino efetivamente nos veio enquanto realidade, o qual por nossos próprios méritos e meios jamais alcançaríamos:

“Perguntaram um dia a Jesus quando viria o Reino de Deus. Respondeu-lhes: – O Reino de Deus não virá de um modo ostensivo. Nem se dirá: Ei-lo aqui; ou: Ei-lo ali. Pois o Reino de Deus já está no meio de vós. (São Lucas 17, 20 a 22)

Também por meio desse reino Jesus se fez homem, e nasceu no meio de nós.

“É verdadeiramente possível que o próprio Cristo seja o reino de Deus, ao qual queremos chegar, cada dia, (São Cipriano de Cartago, o mártir, ano +258, p. 113 Obras Completas. vol. I) ”

Todo reino é composto de súditos fiéis e infiéis, dispostos em pontos ou “locais” diferentes desse mesmo reino.

Nisso reside a maneira distinta na qual a vontade do rei é exercida.

Nos infiéis, onde a ordem e a obediência ao rei são resistidas, a sua vontade real lhes será imposta na aplicação das penas e sanções justas aqueles que desonraram o monarca em seu próprio reino.

Nisto vemos o inferno.

Nos fiéis, os que aceitaram, e aderiram a autoridade do monarca, a vontade do rei será a vontade de seu súdito, porque também a vontade do súdito fiel é a vontade do próprio rei.

Nisto vemos o céu.

Sendo o Pai, uno no filho, os judeus que não reconheceram a Cristo, despiram-se da graça de tornarem-se filhos de Deus, razão porque, irou contra eles, o Pai, através do Filho, e como num ato de deserdação, os excluiu provisoriamente da herança e do reino até que aceitem a Nova Aliança, construída agora não apenas com a nação de Israel, mas com a Igreja, que não sendo nação de um povo só, é a nação universal (katholikos):

‘A pedra que os construtores rejeitaram, tornou-se a pedra angular; e isso procede do Senhor, sendo, portanto, maravilhoso para nós. Por isso, eu VOS DECLARO que o reino de Deus será retirado de vós para ser entregue a um povo que produza frutos dignos do reino. ” (São Mateus 21. 43 e 44)

O que Israel buscava não o alcançou; mas os eleitos o alcançaram, e os outros foram endurecidos. (Romanos 11.7)

 

5. “O PÃO NOSSO DE CADA DIA NOS DAI HOJE.”

 

Acaso algum pai tiraria o pão da mesa de seus filhos, e os atiraria aos cães? (Mt 15.26;Mc 7.27)

Mas nem só do pão do estômago vive o homem.

Portanto, é nítido que o objetivo principal desta súplica na oração, não se restringe ao alimento comum, mas usa do seu modelo para mostrar uma realidade sobrenatural, num alimento muitíssimo superior pelo qual ninguém terá fome, nem sede ao tomá-lo:

“[…] reuni-vos para UM GRANDE SACRIFÍCIO NAS MONTANHAS DE ISRAEL. Ireis COMER A CARNE dos heróis e BEBER O SANGUE dos príncipes da terra: carneiros, cordeiros, cabritos, touros robustos de Basã; NESSE SACRIFÍCIO ao qual vos convido, COMEREIS GORDURA até vos fartardes, e BEBEREIS SANGUE até a EMBRIAGUEZ do SACRIFÍCIO  que OFERECI por vós. ” (Ezequiel 39. 17, 18 e 19)

“Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela que dura até a vida eterna, que o Filho do Homem vos dará. Pois nela Deus Pai imprimiu o seu sinal”. (São João 6, 27)”

Pois a minha carne é VERDADEIRAMENTE UMA COMIDA e o meu sangue VERDADEIRAMENTE UMA BEBIDA.” (São João 6, 55)

No altar da verdadeira Igreja não haverá mais comida comum, mas como ensinado pelo próprio Cordeiro, um sinal da Nova Aliança “[…] porque o reino de Deus NÃO É COMIDA, NEM BEBIDA.” (Romanos 14,17)

“Vós o profanais quando dizeis: A MESA do Senhor está MANCHADA; o que nela se oferece é um ALIMENTO COMUM; (Malaquias 1.12 e 13) ”

Se na Pessoa do Filho, Deus tornou-se carne e sangue, e na carne e sangue Ele tornou-se Pão e Vinho, tornando-se o alimento que transcende a própria Lei Natural, sendo o sacrifício oferecido para remissão dos pecados, na comunhão do nosso corpo com o Corpo sobrenatural de Cristo, nos sinais do vinho e do pão:

“PARECIA-VOS que eu comia e bebia convosco, mas o meu alimento é um MANJAR INVISÍVEL, e minha bebida NÃO PODE SER VISTA pelos homens.” (Tobias 12, 19)

O homem natural é um reflexo do homem espiritual.

Porque o homem natural necessita do alimento natural para sobreviver, também o homem sobrenatural, tornado Filho de Deus pela fé, necessita do alimento sobrenatural para ressuscitar e viver eternamente. A comida comum sustenta nosso corpo até o limite da vida temporal, mas o alimento sobrenatural sustenta nosso corpo e a nossa alma para a vida eterna: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia.” (São João 6. 54)

Se a fome pelo alimento natural se renova a cada dia (cotidianamente), assim também é nossa fome por Deus, o Pão Vivo do céu. O ser humano peca a cada dia, a cada dia, portanto, necessitará receber de Deus o sinal do sacrifício eterno que o repare dos seus delitos:

O pão de cada dia ou cotidiano é o cumprimento da antiga profecia sobre o PÃO SACRIFICIAL ofertado em num altar perpétuo que existiria em todos os cantos da terra:

“E, diante de mim, não faltarão jamais descendentes aos sacerdotes e aos levitas para oferecer os holocaustos, queimar as oferendas e celebrar o sacrifício cotidiano. (Jeremias 33, 18)

“SACRIFICAM a mim em TODO LUGAR e oferecem em MEU NOME uma OBLAÇÃO TODA Pura, pois grande é o Meu Nome em TODAS as nações. (Malaquias 1,11). ”

Ensinou Tertuliano:

“Isto É meu Corpo. Então cremos que o seu Corpo está presente no Pão. Assim, pedindo o pão cotidiano, rogados a Deus viver sempre em Cristo e inseparáveis de seu Corpo. ” (Da Oração. Tertuliano, Cap. VI, ano 160-220)

E São Cipriano de Cartago:

Cristo é o Pão daqueles que comem de sua carne e bebem do seu sangue. Pedimos que esse Pão nos seja dado diariamente a fim de que nós, que estamos no Cristo e recebemos diariamente a Eucaristia como alimento de salvação, não venhamos a ser por intervenção de algum pecado grave, afastados do pão celeste, e assim, impedido de sua comunhão. (São Cipriano de Cartago, o mártir, ano +258, p. 116. Obras Completas. Vol. I)

O Pão nosso de cada dia que é Corpo e Sangue de Cristo, é por isso, o sinal do sacrifício que por ser eterno, está presente cotidianamente. E se não vemos carne, nem sangue nos elementos do pão e vinho, como disse Cristo a Tomé:

Feliz aquele que não viu, e creu. ” (São João 20, 14)

 

6.  “PERDOAI NOSSAS DÍVIDAS COMO PERDOAMOS NOSSOS DEVEDORES.”

 

O Bem que buscamos em Deus é o Bem que devemos compartilhar com o próximo.

A ninguém é dado o direito de suplicar para si misericórdias e clemências, e simultaneamente, negá-las ao próximo por desejar-lhe todo mal, e a severidade de todos os castigos.

A Justiça de Deus dá a misericórdia na misericórdia, e o perdão no perdão:

 “Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão miseri­córdia! (São Mateus 5.7)”

Por isso, nossa penitência maior é o perdão aqueles que nos ofenderam, e se constituíram em nossos devedores, para que Cristo faça brotar o perdão no terreno árido e seco do nosso coração, cujo sangue e água que verteram de Cristo na cruz, o tornara campo fértil.

O que é justo para o outro, por lógica, deve ser justo para mim.

Por esta razão, a medida do juízo de Deus sobre nós será balizada pela medida com que medimos aqueles que estão, conosco, em idêntica situação de devedores:

Porque do mesmo modo que julgardes, sereis também vós julgados e, com a medida com que tiverdes medido, também vós sereis medidos. (São Mateus 7, 2)”

A dívida simboliza o pecado do homem para com Deus e também para com o seu próximo.

Riqueza e pobreza está definida na proporção do crédito e débito.

Aquele que é verdadeiramente rico nada deve.

Ora, Adão e Eva eram ricos porque não tinham dívidas para com Deus, pois ainda não haviam pecado.

Mas quando pecaram, deram-se conta de que estavam nus, porque viram neles toda miséria e insignificância de um ser humano sem Deus, e se envergonharam disso.

Ensinou Santo Ambrósio:

“Eras rico, feito a imagem e semelhança de Deus. Perdestes o que tinha, isto é, a humildade, quando desejas a vingança arrogante, e perdeste o crédito, como Adão, e te tornaste nu, pois assumistes a dívida do diabo que não era necessária. O inimigo possuía a tua Promissória, e o Senhor a crucificou, e a destruiu por seu próprio sangue. (Santo Ambrósio de Milão. Símbolos da Fé. Ano 374, p. 42)

Por isso, essa parte da oração é uma referência a parábola dos devedores:

Por isso, o Reino dos Céus é comparado a um rei que quis ajustar contas com seus servos. Quando começou a ajustá-las, trouxeram-lhe um que lhe devia dez mil talentos. Como ele não tinha com que pagar, seu senhor ordenou que fosse vendido, ele, sua mulher, seus filhos e todos os seus bens para pagar a dívida. Este servo, então, prostrou-se por terra diante dele e suplicava-lhe: ‘Dá-me um prazo e eu te pagarei tudo! Cheio de compaixão, o senhor o deixou ir embora e perdoou-lhe a dívida. Apenas saiu dali, encontrou um de seus companheiros de serviço que lhe devia cem denários. Agarrou-o na garganta e quase o estrangulou, dizendo: ‘Paga o que me deves! O outro lhe caiu aos pés e pediu-lhe: ‘Dá-me um prazo e eu te pagarei! Mas, sem nada querer ouvir, este homem o fez lançar na prisão, até que tivesse pago sua dívida. Vendo isso, os outros servos, profundamente tristes, vieram contar a seu senhor o que se tinha passado. Então, o senhor o chamou e lhe disse: ‘Servo mau, eu te perdoei toda a dívida porque me suplicaste. Não devias também tu compadecer-te de teu companheiro de serviço, como eu tive piedade de ti? E o senhor, encolerizado, entregou-o aos algozes, até que pagasse toda a sua dívida. Assim vos tratará meu Pai celeste, se cada um de vós não perdoar a seu irmão, de todo o seu coração. ” (São Mateus 18. 24 a 35)

 

7. “E NÃO NOS DEIXE CAIR EM TENTAÇÃO.”

 

Deus a ninguém tenta para a prática do mal, porque todo mal se opõe a Deus.

Mas Deus é também Justiça, e,  por justiça, nos tornamos escravos quando na primeira tentação do ser humano, ainda no Éden, a raça humana deixou-se vencer intelectualmente pelo diabo, o qual, por justiça, reclama de Deus o domínio sobre aqueles que ele subjugou, e derrotou.

Assim, é justo ao que fora vencido que se torne patrimônio daquele que o venceu:

Torna-se escravo de outrem, não somente quem foi por esse dominado, mas ainda quem voluntariamente se lhe submeteu. E deste modo torna-se escravo do diabo quem peca de propósito deliberado. Por certo, ocasional e indiretamente, o diabo é causa de todos os nossos pecados. Pois, induziu o primeiro homem a pecar; e esse pecado viciou a tal ponto a natureza humana, que todos somos inclinados a pecar. Do mesmo modo poderíamos considerar como causa da combustão da madeira quem a tivesse secado, fazendo com que se ela facilmente queimasse. Diretamente, porém, não é causa de todos os pecados humanos, no sentido de nos persuadir a cada um deles. E isso, prova Orígenes, por haverem homens que, ainda que inexistisse o diabo não existisse, teriam o apetite da gula, do ato venéreo e semelhantes. E esse desejo poderia ser desordenado se não se sujeitasse à razão; o que depende do livre arbítrio. (Suma Teológica. Q 80 art. 4º,  Santo Tomás de Aquino – Da Causa do Pecado por Parte do diabo) ”

As tentações diabólicas virão, mas Deus, em sua infinita sabedoria e compadecimento, nos deu escolha: sucumbimos a elas; ou as vencemos, e nos fortalecemos por meio da vitória sobre elas.

O próprio Cristo nos deixou exemplo ao permitir ser tentado para nos demonstrar o caminho certo da ascese (perfeição) que temos de trilhar ao depararmos com as tentações:

“Ao rogar para que não caiamos em tentação, somos lembrados da nossa fraqueza e miséria; e rogamos assim, para que ninguém se exalte insolentemente, nem tome orgulhosa e arrogantemente algo como seu, nem ainda considere como sua própria glória a confissão ou o martírio. Pois, ensinando-nos, humildemente, diz o Senhor: – “Vigiai e orai para não cairdes em tentação. ” (São Cipriano de Cartago, o mártir, ano +258, p. 120. Obras Completas. Vol. I) ”

Nisso, temos o epílogo da Oração do Pai Nosso, que em tão poucas palavras expôs todos os preceitos do seu santíssimo Evangelho. E quantos deveres nos são revelados nesta súmula pequena em tamanho, mas infinita em sabedoria?

 


1 – “Por isso o homem deixa o seu pai e sua mãe para se unir à sua mulher; e já não são mais que UMA SÓ CARNE.” (Gênesis 2. 24)

2 – Javé não é Nome Próprio, mas uma expressão no antigo hebraico (YHWH) que significa: “eu sou aquilo que sempre serei”.

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